By Camila Nagay
A pandemia causada pela COVID-19 trouxe à tona inúmeras discussões sobre a interferência dos ambientes construídos na propagação e contágio de doenças. O sistema de ar-condicionado, por exemplo, tem sido colocado em evidência neste cenário, uma vez que passamos mais de 90% do nosso tempo dentro de ambientes internos, boa parte deles climatizados mecanicamente.
Na realidade, a relação entre os ambientes construídos e as doenças infectocontagiosas não é algo novo, mas ocorre desde eventos epidêmicos mais antigos na história. Cada epidemia (ou pandemia) contribuiu para que novas normativas fossem criadas com o objetivo de tornar as edificações menos vulneráveis à propagação de doenças. As ações mais emblemáticas foram a Reforma Urbana de Paris (Georges-Eugène de Haussmann), implementada entre 1852-1870 e, no contexto brasileiro, a criação do Código Sanitário Brasileiro em 1894, período conhecido como “Higienista”.
A partir destes eventos, inúmeras ações foram implementadas para melhoria da infra-estrutura urbana, como a coleta e tratamento do esgoto, fornecimento de água tratada encanada, coleta urbana de resíduos, pavimentação de ruas e calçadas, dentre outras. No que se refere às edificações, também foram criadas normativas como dimensões mínimas de janelas, recuos, etc. Muitas das normativas criadas naquele período estão vigentes até hoje.
Entretanto, é observada uma evolução de paradigmas no que se refere às relações entre “edifícios” e “doenças”, ou seja, os edifícios não se limitam a minimizar e prevenir doenças, mas passam a desempenhar papel fundamental na saúde das pessoas. A começar pela definição do conceito de saúde. A OMS (Organização Mundial da Saúde) entende que o estado de saúde das pessoas é composto pela relação completa entre os estados físicos, sociais e metais, não somente pela ausência de doenças.
Neste sentido, a arquitetura tem assumido importante papel no estado de saúde das pessoas, não se limitando a sua interferência às doenças, mas principalmente promovendo um estado de saúde melhor para as pessoas, também chamado de bem-estar. Em inglês, há dois conceitos diferentes de bem-estar: wellness e wellbeing. O primeiro é usualmente mais relacionado à satisfação e bem-estar mental, enquanto o segundo é mais relacionado ao bem-estar de saúde. Na língua portuguesa, utilizamos a palavra bem-estar para ambas as definições.
Voltando a utilizar o sistema de ar-condicionado como exemplo: um espaço construído com um sistema de ar-condicionado ruim, com baixas taxas de renovação de ar externo ou filtros ineficientes pode agravar doenças crônicas como asma e bronquite, chegando a contribuir para a disseminação de doenças infectocontagiosas. Por outro lado, um bom sistema de ar-condicionado pode contribuir para melhoria da qualidade do ar interno, mesmo quando comparado à ventilação natural.
Outro exemplo de como a arquitetura pode interferir na saúde das pessoas está relacionado ao aproveitamento de luz natural e vistas para áreas externas e a qualidade do sono. Muitos estudos mostram que quando as pessoas estão expostas à luz natural e vistas para o exterior da edificação, o relógio biológico reconhece o ciclo dia-noite e há maior equilíbrio hormonal do cortisol (dia) e da melatonina (noite).