Por Andréa de Paiva
Neuroarquitetura no escritório é projetar espaços mais eficientes, que potencializam a produtividade e o pensamento criativo dos colaboradores. Esse é um dos grandes desafios dos arquitetos.
As estratégias para atingir tal “eficiência” podem variar muito dependendo da cultura da empresa, de quem são os colaboradores e, claro, de quais atividades são realizadas no escritório.
Ou seja, não existe uma resposta exata ou uma lista de soluções que se aplique da mesma maneira para todos os projetos.
Por isso, o desafio de criar ambientes mais eficientes exige a combinação de conhecimento com sensibilidade às particularidades. A Neuroarquitetura, por ser uma área que combina design com conhecimento do ser humano trazido pela neurociência, é uma excelente aliada.
Estudos na Neuroarquitetura e Neuroeconomia mostram que o comportamento é apenas o resultado de uma complexa equação cheia de variáveis. Dessa forma, apontam que o controle consciente da performance e da tomada de decisão é muito baixo.
Ou seja, a criatividade e a produtividade resultam muito mais de processos automáticos que acontecem abaixo do nível da consciência do que apenas da vontade consciente de produzir.
De acordo com pesquisas do psicólogo Daniel Kahneman, vencedor do Nobel em economia de 2002, até mesmo as decisões financeiras são influenciadas pelas emoções [1]. Portanto, compreender esses processos abaixo do nível da consciência é importante para entendermos melhor o comportamento humano.
No caso da arquitetura, diversas informações sensoriais do ambiente físico estão o tempo todo afetando, em algum nível, os padrões de funcionamento desses processos mentais e emocionais que acontecem abaixo do nível da consciência. O resultado disso: o ambiente pode influenciar a performance dos colaboradores sem que necessariamente eles notem [2].
Algumas características específicas do ambiente podem ter impactos no estado mental da pessoa, favorecendo a realização de determinadas atividades.
Nesse sentido, estudos de Joan Meyers-Levy e Rui Zhu, por exemplo, revelam que o pé-direito mais alto pode contribuir para estados mentais mais criativos. De acordo com esses autores, o pé-direito alto permite maior sensação de liberdade.
Dessa forma, facilita pensamentos mais abstratos e percepções mais holísticas e relacionais Características importantes para a criatividade. Isso é conhecido como “efeito catedral”, termo cunhado por Edward T Hall nos anos 1960.
Hall se inspirou na diferença de sensações ao entrar numa capela, que é mais contida, e em uma catedral, com seu altíssimo pé-direito. Por outro lado, o pé-direito baixo contribui para estados mentais de maior foco e concentração, facilitando o pensamento analítico.
Ou seja, em um escritório, tanto espaços com pé-direito alto como baixo são importantes, cada um com um objetivo específico. Por isso, mapear as atividades dos diferentes grupos de colaboradores de uma empresa permitirá definir quais espaços devem ser priorizados.
Aqueles que induzem estados mentais mais criativos ou aqueles que facilitam o pensamento analítico [3].
Contudo, o ambiente contém muitos outros elementos sensoriais que atuam em conjunto. Portanto, pensar apenas na altura do pé-direito pode não ser suficiente. Se outros elementos não forem levados em consideração, eles podem atrapalhar os efeitos que a altura do teto pode induzir.
Por exemplo, a iluminação dos ambientes é um fator que influencia significativamente a performance. Vários estudos apontam para a importância da iluminação natural para regular o ciclo circadiano (nosso relógio biológico) [4].
A luz natural contribui para que os colaboradores atinjam seu pico de energia, atenção e produtividade durante o dia. Já a iluminação do entardecer vai preparando o organismo para a hora de dormir à noite.
Isto é, a iluminação natural é importante para uma melhor performance imediata e para sua manutenção no longo prazo. Isso depende também do bom aproveitamento das horas de sono.
Estudos no campo da Neuroarquitetura também mostram que espaços escuros podem ser fundamentais na hora de projetar ambientes de trabalho com foco no estímulo à criatividade.
De acordo com estudos de Anna Steidle e Lioba Werth, ambientes escuros oferecem às pessoas maior liberdade de restrições. Esses espaços permitem pensamentos mais holísticos e exploratórios, que por sua vez facilitam a criatividade.
No mesmo estudo, as duas pesquisadoras observaram que enquanto os participantes ficavam mais criativos quando a iluminação diminuía, quando o ambiente estava mais claro e bem iluminado eram estimulados pensamentos mais lógicos e analíticos [5].
Ou seja, assim como a iluminação natural deve ser aproveitada da melhor maneira possível no escritório, a presença de espaços menos iluminados e de contrastes entre ambientes claros e escurecidos também é importante.
Uma outra característica bastante estudada que pode impactar tanto o pensamento analítico como o criativo é o corpo. Cada vez mais surgem estudos apontando como o corpo pode influenciar as emoções, as percepções e o comportamento.
O movimento, principalmente as caminhadas, é mais um aliado na hora de projetarmos escritórios mais eficientes. As pesquisas de Marily Oppezzo e Daniel L. Schwartz revelam que caminhar estimula a criatividade tanto durante o ato de andar como imediatamente após.
Caminhar permite um fluxo mais livre de pensamentos, o que pode facilitar insights e conexões entre ideias [6]. Além disso, a neurociência aponta para os diversos benefícios gerados pela atividade física.
Além dos benefícios para a saúde física, o exercício físico impacta diretamente a saúde cerebral. No curto prazo, ele contribui para uma melhora no humor e na sensação de energia e, no longo prazo, ele ajuda a combater os efeitos negativos do stress além de estimular a plasticidade cerebral, o que resulta num cérebro mais eficiente [7].
Quando projetamos ambientes de trabalho, esperamos que o colaborador passe bom tempo do dia ali. Por isso, é importante levar em consideração não apenas efeitos imediatos do ambiente.
Os efeitos de longo prazo não só tendem a ser mais estruturais e duradouros, mas também afetam a performance e a produtividade dos colaboradores [8]. Nesse sentido, o layout dos escritórios pode ser pensado para estimular a circulação interna e a realização de caminhadas.
Além disso, estratégias de comunicação no piso e no posicionamento de escadas e elevadores podem induzir caminhadas mais longas e o uso da escada ao invés do elevador.
Portanto, tenha em mente que as características do ambiente que estimulam produtividade e criatividade não se resumem àquelas discutidas aqui.
Presença de natureza, vista das janelas e estímulos sensoriais que chegam pela audição e olfato, além das oportunidades de ação de cada ambiente, também podem influenciar na performance dos colaboradores.
Por isso, é importante que arquitetos e designers ampliem sua zona de conhecimento para contemplar os insights trazidos pela Neuroarquitetura. Todos os elementos discutidos neste artigo podem ser combinados de maneira a otimizar os resultados obtidos por cada ambiente criado.
O espaço é extremamente rico de estímulos que podem influenciar seus usuários. Enquanto alguns dos estímulos podem estar favorecendo um determinado mental, outros, presentes no mesmo ambiente, podem estar gerando efeitos contrários.
Por isso pensar em aplicar apenas um desses elementos pode não ser eficiente [9]. É preciso conhecimento mais amplo de Neuroarquitetura para compreender a interação entre os estímulos do espaço e criar estratégias direcionadas.
Enfim, isso facilita estados mentais específicos no curto prazo em equilíbrio com a manutenção da saúde e bem-estar a longo prazo.
[1] Kahneman, D. (2011) Thinking: fast and slow. New York: Farrar Straus Giroux; Reprint Edição (2 abril 2013)
[2] Paiva, A. Neuroscience for Architecture: How Building Design Can Influence Behaviors and Performance. Journal of Civil Engineering and Architecture 12(2)
[3] Meyers-Levy, J., Zhu, R. (2004) The Influence of Ceiling Height: The Effect of
Priming on the Type of Processing That People Use. Journal of Consumer Research.
[4] Bedrosian, T., Nelson, R. (2017) Timing of light exposure affects mood and brain circuits. Transl Psychiatry. 2017 Jan 31;7(1):e1017.
[5] Steidle, A., Werth, L. (2013) Freedom from constraints: Darkness and dim illumination promote creativity. Journal of Environmental Psychology Volume 35, September 2013, Pages 67-80
[6] Oppezzo, M., Schartz, D. (2014) Give Your Ideas Some Legs: The Positive Effect of Walking on Creative Thinking. Journal of Experimental Psychology: Learning, Memory, and Cognition, Vol. 40, No. 4, 1142–1152
[7] Suzuki, W. (2017) Os benefícios transformadores da atividade física para o cérebro. TED Women 2017
[8] Paiva, A. Jedon, R. (2019) Short- and long-term effects of architecture on the brain: Toward theoretical formalization. Frontiers of Architectural Research
Volume 8, Issue 4, December 2019, Pages 564-571
[9] Spence, C. (2020) Senses of Place: Architectural Design for the Multisensory Mind. Cognitive Research: Principles and Implications (CRPI)